Rick Rubin: o gênio silencioso que redefiniu a música como conhecemos

Da Def Jam a Johnny Cash e Kanye West, a jornada do produtor que parece não fazer nada e faz tudo ao mesmo tempo.

Rick Rubin: o gênio silencioso que redefiniu a música como conhecemos

Frederick Jay "Rick" Rubin nasceu em 1963, em Long Beach, Nova York. Ainda menino, ouvia heavy metal e punk rock, chegando a pegar o trem até Manhattan para ver os Ramones. Esse ambiente suburbano ligado à cena de rua moldou sua sensibilidade. Na faculdade, na NYU, Rubin se deixou contagiar pelo rap que surgia dos guetos nova-iorquinos: produziu em 1983 o single "It's Yours", de T La Rock e Jazzy Jay, sucesso imediato nas boates.

Para Rick, o hip hop inicial era só "outra versão do punk": música das ruas, crua e autêntica, que parecia confirmar que ele também teria seu lugar ali. Essa mistura (guitarras distorcidas do punk e batidas de vinil do rap) viria a nortear sua estética minimalista, valorizando o instinto sobre a técnica.

O primeiro grande salto na carreira de Rubin veio com a criação da Def Jam Recordings em 1983, ao lado de DJ Jazzy Jay e depois Russell Simmons. Em 1984, o novo selo emplacou um hit com LL Cool J ("I Need a Beat") e logo expandiu para Beastie Boys, Run-DMC e Public Enemy. Rubin ajudou a popularizar o hip hop ao produzir discos pioneiros desses grupos.


Outro momento marcante chegou nos anos 1990: ao assumir seu selo (rebatizado American Recordings) ele resgatou a carreira de Johnny Cash. Em 1994, o álbum American Recordings foi um sucesso inesperado, rendendo cinco Grammys e reintroduzindo Cash ao grande público. Esses marcos (do rap nas paradas à revitalização de um ícone do country) cimentaram Rick Rubin como produtor visionário.

Um episódio que simboliza bem o estilo de Rubin foi sua reunião com Johnny Cash. Em 1993, Cash já havia abandonado turnês e duvidava por que alguém o chamaria para gravar. Rubin conta que apenas convidou Cash: "vamos sentar e tocar as músicas que você ama". Na sala de estar do produtor, Cash tocou clássicos country e folk que Rubin jamais tinha ouvido, um momento simples, mas "magnífico".

Johnny Cash e Rick Rubin.


Quando Rick decidiu que a escolha ideal para Cash seria "Hurt", cover de Nine Inch Nails, ele fez uma demo cantando a letra no estilo de Cash. Segundo Rubin, ao ouvir a ideia, o cantor apenas olhou para ele sem entender, até ouvir a letra e o arranjo quase despojado. Foi então que o próprio Cash disse: "Vamos tentar". A partir desse encontro nasceu a versão épica de Hurt em American IV, que transformou um hino industrial em uma elegia suave e garantiu o lugar de Cash na história contemporânea da música. Esse bastidor revela o processo de Rubin: escutar o artista, selecionar repertório do seu universo pessoal e guiá-lo sem imposições de ego.

Rubin transita por gêneros e culturas como poucos produtores. Ele próprio destacou o parentesco entre punk e rap (ambos contestadores), o que abriu espaço para trabalhos que uniram rock e hip hop, como "Walk This Way", do Run-DMC. Em estúdio, aplicou conceitos de uma música em outra: ao ouvir a faixa "Bound", de Kanye West, ele removeu elementos de R&B e deixou uma única nota de baixo com uma aresta punk. Assim, introduziu no hip hop uma fisicalidade emprestada do rock.



Paralelamente, após deixar Nova York, Rubin mudou-se para Los Angeles e abraçou o heavy metal: em 1988 fundou a Def American e assinou com Slayer e Danzig. Em 1991, levou o Red Hot Chili Peppers ao multiplatinado Blood Sugar Sex Magik, unindo funk-rock e rock alternativo. E ele não parou aí: sua discografia vai de Metallica e Slayer a Neil Diamond, Jay-Z, Tom Petty, Adele, Kesha, AC/DC e Aerosmith, além de Cash e artistas country da American Recordings.

Rubin dialoga com várias tradições e territórios musicais (do underground ao pop global) reinterpretando-as com simplicidade. Esse ecletismo rendeu parcerias inesperadas e influenciou novos gêneros: produziu clássicos do nu metal (Linkin Park, Slipknot), do indie (The Strokes) e do hip hop moderno (Eminem). Seu nome acompanha sucessos de diferentes cenas, provando como constrói pontes culturais usando poucos elementos essenciais.

Em 2007, foi nomeado co-presidente da Columbia Records, tentando reformular o selo pelas lentes da criação, mas seu estilo zen logo colidiu com a burocracia corporativa. Em 2012, após contribuir com o álbum 21 de Adele, vencedor do Grammy de Álbum do Ano, Rubin deixou a Columbia e reativou sua American Recordings sob a Republic Records. Nesse novo ciclo, trabalhou com ZZ Top, Avett Brothers e Band of Horses.

Em 2023, lançou o livro The Creative Act: A Way of Being (O Ato Criativo: Um Modo de Ser), ampliando seu trabalho para além das mixagens. Em cada projeto paralelo, o que se revela é uma visão curiosa: ele não precisa mostrar virtuosidade técnica (ele mesmo admite: "não sei nada sobre música"), mas sabe extrair o melhor de cada artista, como demonstrava ainda jovem, quando assinava como DJ Double R.

As próprias palavras de Rubin ajudam a entender sua filosofia. Perguntado sobre o que o atraiu no hip hop, ele respondeu:

"Eu adorava punk rock, outra música contra o establishment. Inicialmente, o hip hop parecia ser outra versão do punk... Era música feita pelas pessoas das ruas, para as pessoas das ruas. Esse caráter genuíno e imediato mostrou-me que eu poderia ter um lugar nessa cultura."

Sobre sua abordagem minimalista, Rubin confessou:

"Não tenho habilidade técnica e não sei nada sobre música. Sei o que gosto e o que não gosto. A confiança que tenho no meu gosto e na minha capacidade de expressar o que sinto provou ser útil para os artistas."

Ao falar do trabalho com Johnny Cash, descreveu a sessão:

"Ele sentou na minha sala e começou a tocar essas músicas para mim… foi magnífico."

Essas falas revelam a serenidade do produtor: ele convive no estúdio como um guia paciente, em vez de um maestro autoritário.

Hoje, Rick Rubin é visto como uma das figuras mais influentes da música moderna. Em 2007, a MTV o chamou de "o produtor mais importante dos últimos 20 anos" e a revista Time o incluiu entre as 100 pessoas mais influentes do mundo.


Seu legado é real: gerações de artistas (do hip hop dos anos 80 ao pop atual) carregam o selo Rubin. Estilisticamente, deixou a ideia de que menos pode ser mais; conceitualmente, mostrou que um produtor pode ser um facilitador espiritual da criação, reunindo mundos distantes em uma mesma música.

Mesmo depois de produzir centenas de álbuns que muitas pessoas amam (e às vezes nem sabem que ele fez), ainda é difícil explicar a importância de Rick Rubin. Ele parece fazer pouco, mas na verdade faz muito.

Rick Rubin continua trabalhando de forma discreta, unindo o antigo e o novo. Sua influência aparece em cada nova música de rua ou voz clássica sem edição, mudando silenciosamente o jeito de produzir música nos dias de hoje.