Jazz aos pés do Monte Fuji - A viagem musical única de Yussef Dayes

O baterista britânico que viajou ao Japão e realizou uma sessão de jazz diante do Monte Fuji. O resultado dessa visita ao oriente virou um documentário.
No início de 2025, Yussef Dayes publicou no YouTube um documentário intitulado Yussef Dayes In Japan (Film) 富士山. Com 46 minutos de duração, o filme mostra o baterista britânico em passagem pelo Japão para uma série de shows, gravações e experiências culturais. A principal delas acontece diante do Monte Fuji, onde Dayes e sua banda gravam uma performance ao ar livre.
Mas o filme vai além da cena principal. Ele acompanha Dayes em deslocamento por Tóquio e arredores, em visitas que revelam um interesse muito claro: entender a relação entre som, espaço e cultura no Japão. O documentário é uma peça rara na discografia visual contemporânea, e mostra como Dayes se consolida como um dos músicos mais relevantes da cena instrumental global.
Para entender o impacto, é preciso saber quem ele é.
Yussef Dayes nasceu em Londres, em 1993, filho de mãe inglesa e pai jamaicano. Começou a tocar bateria aos quatro anos. Estudou com Billy Cobham aos dez. Ficou conhecido em 2016 com o projeto Yussef Kamaal, onde já mostrava uma proposta que cruzava jazz e muito instrumentalismo.

Depois disso, firmou o nome com colaborações (como o disco com Tom Misch em 2020) e em 2023 lançou Black Classical Music, seu primeiro álbum solo. O disco venceu o Ivor Novello Awards e foi citado em listas de melhores do ano por veículos como Mojo, The Guardian e Complex.
Yussef não é um baterista tradicional. É um músico que pensa em estrutura, ambiência e captação. Seu estilo se apoia no improviso, e sua bateria é conduzida como uma linha de frente. E o formato de banda, com teclados, baixo e sax, se adapta ao seu ritmo. Ele parte de outra lógica. Um bom exemplo é seu episódio no famigerado programa COLORS, onde é possível identificar como e Yussef utiliza sua bateria.
Cruzar o globo e partir para a viagem ao Japão começou com uma série de apresentações no Blue Note Tokyo, entre 23 e 26 de fevereiro de 2024. Em seguida, Dayes e a equipe seguiram viagem para uma rota de exploração cultural. O documentário foi dirigido por Sam King e Nick Dwyer, com produção de Andy Nagashima e Steve Gaudin. A direção de fotografia é limpa, funcional, e permite que as cenas respirem sem excessos.
A música em si, torna-se apenas uma passagem e trilha sonora introdutória para o que vai ser mostrado. Ao final de cada, Yussef utiliza o espaço para demonstrar suas vivências no Japão.
Em Turquoise Galaxy, somos apresentados a parte 1, intitulada como Foundation, conta sobre sua formação musical em casa, retornando para suas lembranças em Londres, que exerceram um papel fundamental em sua formação como músico e artista. No entanto, também é mostrada sua visita a Shogo Yoshii, músico que exerce papel nos tradicionais “Taiko”, o tambor japonês.
Já em The Light, é apresentado um modo novo em exercer caligrafia com base na filosofia, algo quase terapêutico.
Chasing the drum é a visita a um mundo musical vasto e profundo no oriente, com um papo muito enriquecedor sobre a construção dos álbuns de Yussef e vinis antigos, como o Airto Moreira, percussionista Brasileiro. A
mami e Fuji Yama trás Minami Kizuki, em duas faixas totalmente voltadas a um elemento central do imaginário de um som oriental, que é a utilização do clássico Sanshi, tocado por Minami.
Como complemento, a faixa ainda nos conta sobre a construção de absolutamente tudo da Audio Technica, até mesmo a visita a um dos estúdios mais bem isolados acusticamente.

Tudo isso acaba em A Love Letter to Salvador, em que ao final os músicos têm que abandonar o local pelo frio e pela chuva. Nos levando até The Colour Purple, em uma apresentação no Blue Note Aoyama
Yussef parece saber exatamente do que o espectador espera saber a cada música, construindo todo um universo muito claro sobre a arte e sua visita e visão do local ali mostrado.
É engraçado ver como a música que é dele, faz total sentido em relação ao que é mostrado na viagem. Torna-se um complemento
A performance diante do Monte Fuji é a mais direta do projeto, que encarrega de chamar toda a atenção para o que busca ser contado. Gravada em plano aberto, com estrutura reduzida, ela mostra Dayes (bateria), Rocco Palladino (baixo), Elijah Fox (teclado) e Malik Venna (sax). Eu gostaria verdadeiramente de saber como foi feita a produção e preparação em um espaço como esse. É como se essa escolha de cena fosse retirada diretamente de um filme, é hipnotizante.

Esse tipo de performance lembra muito mais uma instalação do que um show. É uma lógica muito distante da do entretenimento e muito próxima da escuta real. E esse movimento é coerente com o momento atual do artista. Depois de anos consolidando uma linguagem própria, Dayes parece buscar contextos que aprofundem sua música. Não mais feats ou festivais, mas experiências reais. Projetos que exijam deslocamento, troca, presença.
Em entrevistas anteriores e até mesmo no momento do documentário ao falar sobre sua família e formação, o músico já havia dito que sua inspiração não vem apenas de sons, mas de ambientes, de cheiros, de imagens, de vibrações.
Yussef Dayes In Japan é, acima de tudo, um documento importante para entender os caminhos possíveis da música instrumental em 2025. Não é um disco, mas também não é só um vídeo. Dayes mostra que ainda existe espaço para o artista que quer ir até o som, e não apenas distribuí-lo.
No fim, o projeto cumpre uma função rara, a de conectar realmente quem assiste com o que está sendo tocado e a cultura a ser mostrada, mesmo que seja quase literalmente um outro mundo.









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