A pluralidade dos trabalhos de Gustavo Soares.

O universo criativo tem como destaque sua diversidade de caminhos que podem ser percorridos, e nesse cenário é importante valorizar artistas que trabalham com diferentes formas de expressão. Gustavo Soares é um exemplo disso, sendo protagonista como stylist, produtor musical e DJ ao mesmo tempo.
Nascido em Taubaté, ele tem criado uma carreira que une moda e música de forma autêntica. Mesmo sendo relativamente novo na profissão, seu trabalho mistura pesquisa detalhada com boa intuição. Nos seus projetos de styling, produção musical e curadoria de moda, ele captura identidades e as transforma usando elementos visuais e referências culturais.
Em nossa entrevista, falamos sobre seu processo criativo, como ele transita entre diferentes áreas artísticas, seu trabalho no acervo Vecchia Stella e parcerias com marcas conhecidas como New Balance. Confira a entrevista logo abaixo!
Qual é o seu processo criativo ao desenvolver um styling para uma campanha ou desfile?
Meu processo criativo, quando estou atuando como stylist para alguma campanha ou desfile, obviamente parte do briefing que me é dado, mas, particularmente falando, eu costumo associar alguma pesquisa que me soa interessante e coerente com meu cliente e traduzir isso através desse briefing.


Styling para Spice by Silva.
Acredito que essa seja uma maneira de colocar um toque meu nas coisas, fora a parte de edição e composição: trazer algo interessante do meu olhar e aplicar em algo “cru” e já “direcionado” que me trouxeram. É uma forma existencialista de trabalhar, eu acho. Para mim, nada é pré dito, nem quadrado nem muito viajado. Resumidamente, meu processo tem cinco pilares: pesquisa, fundamento, interpretação, nada de overdoing e intuição.
Você transita entre moda, música e styling, de onde vem essa aspiração de atuar em vários nichos?
Bom, primeiramente vou contar minha caminhada. Eu sou de uma cidade pequena (hoje em dia se desenvolveu bastante mas, antes, a rua de casa por muito tempo nem tinha asfalto; o Wi-Fi que chegava no bairro não dava nem 1 Gb) chamada Taubaté.
Desde pequeno eu sabia que queria viver de música. Sempre tive contato forte com isso; minha mãe sempre fez de tudo para me aproximar. Então, com 13 anos, comecei a produzir no FL. Eu era apaixonado por boom bap e toda a cultura em torno disso. O skate também foi presente na minha vida, o que só reforçou a imagem de tudo que eu gostava: tinha um comportamento específico, uma vestimenta específica. Eu sempre me interessei por identidade e por imagem. Com 14, tive uma marca de roupa com meu primo, que era total referência da Golf Wang, mas cidade pequena, né? Acabou não dando muito certo e deixamos quieto. A partir daí, fui trabalhando com o que eu podia (por ser menor) para comprar meus equipamentos, porque não queria só produzir, queria cantar: lavei carro, entreguei panfleto, entreguei marmita…
E fui seguindo com meu sonho de viver de música. Com uns 16, comecei a conhecer os grupos de venda do Facebook. Meu vizinho tinha uma loja, a Supboyz, que já vendia bastante fita no Instagram. Aí comecei a garimpar na feira da minha cidade, nos brechós e online, para revender essas roupas. A partir daí, começou meu contato com a comunidade e com a moda.
Antes de ser Vecchia Stella era lojinha do Soares.

Fui seguindo nessa, sonhando que a música iria virar. Com uns 18, eu já produzia com disco de vinil numa máquina analógica chamada 404sx. Inclusive, tem um pouco do meu trabalho no Spotify, YouTube e SoundCloud como “Coeio”.
Enfim, nada fluía na música e eu estava sem trampo, com um dinheiro guardado de vender roupas. Aí decidi tentar a bolsa do curso de produção de moda no Senac que tinha visto na internet.
É só ser rápido que você consegue a bolsa, 100 %. Feito isso, passei no curso e, em 20 dias, tive que organizar minha mudança para São Paulo. 23 de fevereiro de 2023 foi minha primeira aula.
Vim morar na casa da minha irmã e de mais duas amigas, estudando o curso e vendendo roupas. Eu já estava meio desiludido com isso de ganhar dinheiro com música. Comecei a focar nessa nova área de vender roupas e fui deixando a música meio de lado.
Em dois anos as coisas começaram a fluir. Hoje voltei a produzir, pretendo começar a discotecar e tal, mas é isso.
Sempre quis viver de música. Comecei a vender roupa e conhecer esse outro lado da coisa que eu já achava legal pela identidade da comunidade da música. Consegui vir para São Paulo e as coisas fluíram como criativo stylist antes de música artista.
Uns cinco anos atrás, quando eu estava na correria de vender os kits, eu e meu parceiro Vini Gon (que hoje se chama Mochakk, fez meu autoral etc.) já tirávamos uma brisa em styling e fotos e todo esse rolê. Mas não entendíamos nada; na nossa cidade eu devia ser o único menor de 20 anos que vestia loafer. A gente só gostava e fazia, por intuição.

Essas fotos fizemos para uma marca de Pindamonhangaba de um amigo nosso, Mind Studios. Ele foi o primeiro a acreditar na gente nesse quesito, e a partir daí começamos a desenvolver esse senso estético e de direção de imagem, interpretação de identidade etc.
Fizemos essas para Cockers em 2023. Nada oficial, foi só uma brisa no banheiro de casa.


Um fato curioso também é que tenho vontade de seguir na moda com trilhas sonoras. A trilha desses dois fashion films que dirigi são minhas.
Bom, e aí foi isso: um mano de cidade pequena, sempre quis viver de música; minhas referências começaram na música, descobri o mundo de vender roupas e vintage second hand, fui conhecendo pessoas e novos horizontes a partir disso, passei num curso, fiz o que tinha que fazer e, dois anos depois, começou a fluir. Agora pretendo voltar às minhas atividades na música também.
Mas a princípio, eu sei fazer música, sou produtor. Esse negócio de moda e styling eu só sigo minha intuição e meu gosto. Nunca foi algo em que eu me importei muito, gostava só de vender roupa.
Como surgiu a ideia de montar um acervo com uma curadoria tão definida?
A ideia do acervo é pura paixão por objetos. Sou apaixonado por símbolos materiais, tudo que se pode palpar e tem um significado. Na minha cabeça eu não compro uma jaqueta, eu compro um projeto, sabe?
A paixão por marcas italianas vem da CP Company, uma marca que conheci em 2019 e com a qual me identifiquei profundamente pela índole do designer fundador Massimo Osti. O cara ignorava tudo que acontecia na moda. Todo mundo falava para ele desfilar em Milão, mas ele preferia só seguir a intuição dele, sem querer saber o que estava na moda ou não, sem sair da cidade dele. Ele é de Bolonha. A marca foi fundada lá e ele se recusava a ir para Milão e ceder a todo esse glamour da moda. O negócio dele era objetos, ressignificar roupas, tecido, fundamento e arte, e é exatamente como eu penso. Conversando mais profundamente digo que não gosto de moda, não gosto do mundo fashion; meu negócio é tradição, comunicação, sociedade política, arte, desenvolvimento, design, pesquisa, matéria prima, tudo menos moda fashion.



A partir daí, quis ver essas peças, o que me levou a me desdobrar para conseguir comprar uma.
A curadoria foi basicamente um atendimento à demanda: muita gente perguntava onde eu comprava minhas roupas, que queriam se vestir parecido comigo. Então tive a ideia de vender minhas próprias roupas e ir escalando esse fluxo de compra e venda.
Eu entendi que conseguia criar desejo nas pessoas sobre o que eu usava, e se eu faço isso e depois trago para vender, é tipo ensinar a pescar e mesmo assim dar o peixe, mas eu ganhava com isso.
Como a experiência de ser DJ se relaciona com o seu trabalho no styling? Há pontos em comum entre os dois nichos?
Bom, ser DJ vem desse meu background da produção e sim, tem tudo a ver. O styling basicamente atua como diretor de estilo, dando um sentido imagético para o que é material interativo visto só como pedaço de pano. Para mim é quase um diretor de arte só que da roupa e de quem ou do que a veste visual merchandising etc.
E foi o que eu disse: a música é um movimento cultural.

Tudo que envolve cultura envolve sociedade política, o que cria significado. Esses significados precisam de símbolos materiais para serem traduzidos e representarem um grupo social ou algo do tipo.
Com tudo isso, o hip hop, o funk, o techno e o house, entre diversos outros gêneros musicais, têm seus símbolos fundamentados na história e na identidade do movimento.
Ser DJ para mim é só a continuação desse trabalho de direção e comunicação à sociedade de certa forma, com a comunidade.
Eu sou fascinado por Stüssy por causa daquelas fotos do J Dilla, pelo Mr Goldie. A CP Company no início tinha parceria com Lúcio Dalla, um artista italiano ativista comunista, e as roupas eram ressignificação de muito arquivo de militaria etc.

Então sim, a música e a moda têm pontos em comum. Trabalhar com os dois para mim é sobre ser ativo na cultura, tudo faz parte de uma comunicação só pesquisa, identidade, simbologia etc.
Onde você pretende chegar na música? Quais metas ou projetos que tem como objetivo?
Na música quero muito atuar como consultor criativo stylist de algum artista, é meu objetivo principal na área. Mas pretendo seguir com minhas produções e trilhas sem compromisso, com artistas que acredito se expressando em cima das minhas produções, mais pelo hobby, é minha paixão. A moda já tem me pagado e eu não gosto muito dela então a música vou me relacionar com paciência e carinho. Mas pretendo lançar álbuns, dirigir clipes que produzi a música, comunicação e identidade de artistas. Em breve posso voltar a cantar minhas letras nunca se sabe…
Você vê alguma disciplina como moda, música, arte visual está de alguma forma exercendo maior influência nas outras?
Hummmm, uma é completamente influenciada pela outra, é tipo o emoji de reciclagem ♻️. A arte visual talvez seja o mais burocrático disso tudo porque nem todo mundo tem acesso a exposições e tal, mas um pixo é arte visual, arquitetura de resistência é arte visual. Então nada muda as três influenciam uma à outra constantemente.

Quais foram as fontes de inspiração que você teve para a execução da campanha do New Balance Abzorb 2000?
Esse rolê do Abzorb foi uma doideira. Eu não executei a campanha em si foi o tease que fiz. Fui escolhido pelo próprio time da New Balance global pessoal da NB Brasil nem sabia que eu existia. A princípio eu ia fazer uma consultoria para o lançamento do tênis para as ativações e todo o branding de lançamento, mas decidiram deixar na minha mão. Então em vez de pedirem minha opinião sobre como explanar o tênis escolheram logo eu de uma vez e falaram faz do seu jeito que vai dar certo.
Aí fiquei nesse contato com eles. Quem intermediou isso foi meu amigo Mikey da agência Oooooopen.
Vieram para o Brasil já tínhamos uma ideia fizeram o sample no meu tamanho o primeiro par existente do Abzorb foi o meu e fizemos as fotos.


Fato curioso: quem fez as fotos foi ninguém mais ninguém menos que Daniel Pacitti (@daaaaaaaannnnnn). Esse moleque foi minha maior referência profissional por todo o trajeto.
Até hoje ele é muito louco estar envolvido nesse episódio. Hoje em dia somos amigos, mas antes era muito distante eu era muito fã do trabalho dele me identificava muito mesmo todo rolê dele gostar de reggae e tal e aí conhecer ele desse jeito foi muito louco.
E sobre fonte de inspiração não tive nenhuma só segui minha intuição nada foi muito pensado. Eles confiaram em mim, eu confiei em mim e só fizemos.
De onde surgem suas inspirações criativas para produzir seus trabalhos no geral, visto que todos seguem a mesma ideia e formatos?
Bom, não acho que todos sigam a mesma ideia e formato. Tenho dois anos de carreira só então ainda vou surpreender bastante vocês. Em breve vou realizar uma exposição que fiz toda a direção criativa com meu amigo Wut eu trabalho em várias entrelinhas que ninguém sabe então mesmo que não pareça não seguem a mesma idéia e formato meu desafio é sempre atualizar a ideia é aprimorar o formato.
Minhas inspirações criativas surgem de acontecimentos sou uma pessoa muito mas muito observadora chega a ser problemático às vezes. Me inspiro muito com pesquisa com origem vejo algo interessante e jogo no Google ou no ChatGPT para entender melhor sobre e aí me interessei e vou ver um vídeo de horas sobre e assim sigo me inspirando.
Conversas me inspiram bastante também diálogos etc.
E objetos arquitetura tudo que é material e reage com luz e sombra me inspira de certa forma.
Tem um projeto ou conteúdo que merece ser visto?